Transcrição de entrevista de Osnília: (Entrevista e transcrição: José Elias)
Osnília: Meu nome é Osnília
de Avelar Meireles, moro em Piranema desde 79, e há mais ou menos uns 20 anos
em me interessei pelo congo, por morar nesta rua aqui da sede. Morava aqui na
frente. Aí todos os domingos eu ouvia os tambores, o som dos tambores que viam
da casa de Seu Antero. E a gente tinha medo de chegar porque Seu Antero era um
homem... que nunca casou, solitário, vivia na casa dele e a gente sentia um
pouco de medo dele. A gente não se aproximava. A gente foi crescendo e foi
vendo que Seu Antero passava e falava “bom dia, boa tarde”, sempre sisudo e eu
fui... depois que eu comecei a trabalhar aqui na região, como professora,
passei a me interessar, ir a Roda d’Água, e comecei a gostar. Ainda morando
nessa rua eu comecei a fazer parte da banda, assim que Seu Antero faleceu,
construíram essa casinha aqui e comecei a fazer parte. Vinha aqui pras reuniões
pra ajudar. E foi é... (pausa) emanando em mim essa... essa curiosidade, essa
vontade de ouvir o batuque. Achar
interessante, legal, que a gente se divertia, ao som do tambor, ao som das
músicas cantadas, os jongos ou os congos. Eu fui empolgando. Quando eu, aí eu
passei a fazer parte com o José Luís Araújo, que a gente fazia parte do
movimento popular do bairro, da Associação de Moradores, e aí o Zé Luis me
convidou, José Luís Araújo, filho do Seu Vitório Araújo. Zé Luís me chamou e a
gente começou a fazer, eu comecei a fazer parte, aí a gente fez... começou a
trazer o movimento da Associação pra cá, trouxe o pessoal da Associação pra
banda de congo.
Elias: E hoje ele dá o nome à escola.
Osnília: E hoje do CMEI, José Luís Araújo.
Elias: Que você é Diretora.
Osnília: É. Eu sou a Diretora da Escola. E... e aí nós começamos, e
eu comecei . Atuei de vez, mas entre as idas e vindas porque as pessoas
aqui elas tem uma cultura diferente da
minha, pensam diferente, são pessoas é...
com um nível de escolaridade... pequena.
Não tem essa expansão de, como é que eu vou falar pra você, de
abertura, política é... social. E eu
saio é porque eles (tá meio confuso, eu não posso falar essas coisa não)
(risadas). São pessoas muito simples (risadas). E a gente está aqui, a gente
que tem um pouquinho mais de... de cultura, a gente está aqui pra ajudar. E eu
gosto de estar aqui, me aborreço, me divirto, mas desde um tempo, em 2009, que
estou sempre aqui com eles... fazendo parte... da Banda de Congo de São
Benedito de Piranema, fundada em 9 de Marco de 1937. É a primeira banda de
congo de Cariacica. Foi fundada... eu só me lembro do Seu Antero, mas pela
idade de Bendito Pereá, Benedito Pereá deve ser dessa leva (risadas). Seu
Vitório também, seu Vitalino, é... Seu Luís, o marido de Benedita, que é a
Rainha da Banda de Congo, não sei porque a denominação Rainha, porque ela
carrega o mastro, talvez, por ser aquela que... que anda mais enfeitada. Eu não
sei dizer porque rainha da banda. E nas outras bandas eu não sei se tem também,
eu sei que tem aquela aqui, que tem uma veste mais diferenciada das outras é
aquela que carrega o mastro com o São Benedito, de São Benedito.
Elias: aqui na região de Cariacica eu só vejo Rainha aqui.
Osnília: na banda de congo de Piranema, né?
Elias: tem a Rainha também na Banda do Cya Cumbi. Mas a banda do
Cya Cumbi não é uma banda de congo.
Osnília: É uma mistura, né?
Elias: É uma mistura. Tocam no palco, com instrumentos de guitarra,
teclado, então não é uma banda de congo tradicional. Lá também tem Rainha. Mas
nas outras não tem.
Osnília: Só aqui na de Piranema que tem Rainha. A exclusividade da
Benedita.
Elias: Mas em outras culturas parentes do congo, exemplo, a congada
de Minas, lá tem Rainha. Tem Rainha e tem Rei também. E aqui não tem Rei.
Osnília: Só tem o Mestre.
Elias: Já teve Rei no passado?
Osnília: Não, acho que não. Tem que perguntar a... Mas eu acredito
que não. Sabe por quê? Porque essa questão da Rainha que Benedita fala que ela
é a Rainha é só daqui e nunca foi mencionado Rei. Que menciona sempre é a
Rainha, a... o Mestre. O Mestre é aquele que... toca o... faz o... como se
fosse o vocalista da banda. Ele que puxa a mulher, ele é a primeira voz, ele
que dá o... o som de quando começar a bater, o tambor, da cantiga que ele vai
entoar, e ele usa o apito pra iniciar e pra finalizar, o mestre a função dele é
assa, de cantar, ele que inicia, e as mulheres fazem a segunda voz, cantam só o
refrão. É engraçado isso, eu acho engraçado porque as mulheres, que a gente
acompanha, mas sempre a voz do mestre é que sobressai, e na hora do refrão a
voz da mulher é aquela voz que tem... é... mais destaque. E a voz de destaque
aqui na banda é a voz da Maria, por isso que eu falei na reunião que Maria ela
é essencial na Banda, porque ela sabe todas as letras, sabe cantar, e não
ensina pra gente. Não passa. Não sei se é... não sei se é medo de perder o que sabe,
de ser exclusivista... Eu num... eu num entendo bem isso direito.
Elias: Você sabe por que que a Banda recebeu o nome de São
Sebastião? Não. São Benedito?
Osnília: São Benedito não é o padroeiro dos negros? São Benedito
não é o Santo Negro? Na Igreja Católica. Agora a história de São Benedito eu
não sei. Aí tem que procurar lá saber. É so São Benedito é o Santo padroeiro
dos negros, então todas as bandas daqui, a única banda da região que não é São
Benedito, que não tem são Benedito como santo, no estandarte, é a de Taquaruçu,
que é São Sebastião, São Sebastião de Taquaruçu. Mas o restante todas elas são,
São Benedito.
Elias: São Benedito é o padroeiro de um monte de banda de congo do
Estado.
Osnília: Na época de... é dia 26 de dezembro, que é o dia dele, né!
Aí a história dele seria talvez até interessante você colocar essa questão,
mencionar a história do santo na sua Tese. Procurar saber...
Elias: Eu já pesquisei.
Osnília: eu não conheço a história, (...) nunca...
Elias: Eu já pesquisei. O São Benedito ele sempre foi colocado para
os Negros porque ele também era negro. Da Etiópia. Ele era da Etiópia. Mas
vivia na Itália. Ele virou Frade, Frei na Itália. Mas ele é filho de
etíopes. Africanos. Aí eles aceitaram o
São Benedito como Santo Padroeiro. Só que aí ele passou, na cabeça dos negros,
a ajudá-los a lutar contra a escravidão. A intenção dos brancos era que ele
fosse o catequizador dos negros. Por ser negro também. Mas pegaram o São
Benedito e fizeram dele uma pessoa que lutava ao lado deles. Contra os donos
dos escravos.
Osnília: Que legal isso aí né? É interessante você colar isso. Que
nem os próprios é... os próprios congueiros conhecem, acredito, a história do
São Benedito. Só sabem que o São Benedito era negro, e... (...)
Elias: Qual a importância da Banda de Congo para a comunidade de
Piranema?
Osnília: Olha Elias, pra
mim, to colocando pra mim, não enquanto comunidade, enquanto Osnília, que participa da Banda de
Congo, que gosta, mas, assim a comunidade sabe que... a... tem a banda de
congo, mas não tem aquele prestígio todo, devido aquele pré-conceito
elaborado(pausa) da religião afrodescendente com a banda. Misturam um pouco as
coisas. Gostam de ver quando a gente sai à rua, acompanham. Mas dizer que a
comunidade vem participar, quer ajudar, não. Tem morcego, na área. Então assim,
é... eu tenho medo desses bichos (risadas). Eu num vejo a comunidade, assim...
Eu vejo que é importante para a comunidade, porque a gente está inserida nela.
Mas a comunidade, a comunidade em si, não sei se você está me entendo, não vê a importância de ter a banda. Se visse
a importância da banda, se conseguisse enxergar isso, mesmo as pessoas que tem
uma certa “cultura” viriam mais, se interessariam mais para saber, ou se é
falta da gente chegar também e chamar. Mas quando a gente chama, a “não tenho
tempo”, não se interessa, é coisa de macumba. Por mais que eu tente
desmistificar isso para a comunidade que eu conheço, estar envolvida como
diretora de Escola, estar na banda de congo, mas aí eu não frequento a Igreja
Católica. Então...
Elias: Existe alguma relação, por menor que seja, com a Igreja
Católica?
Osnília: Eu acredito que existe sim, a devoção.
Elias: A devoção, mas a comunidade não participa?
Osnília: Não. Mas se chamarem a gente
vai.
Elias: Mas eles chamam?
Osnília: Não, não chamam. Não chamam.
Nem quando tem a festa de são Pedro eles não chamam. Já na comunidade São
Sebastião, em Taquaruçu, quando tem... domingo passado quando foi a festa, a
banda participa.
Elias: Sábado.
Osnília: da comunidade. Porque os
próprios congueiros de lá eles participam da comunidade católica ali de São
Sebastião de Taquarçu. Já os congueiros daqui a maioria deles participa da
Comunidade Católica de Bairro Operário, Nossa Senhora de Lourdes. E aqui de
Piranema mesmo, Joel participa de outras comunidades, ele não participa da
comunidade de Piranema. E as outras mulheres daqui, a Dona Josefa e da Dona
Conceição, elas... elas também não vão à Igreja Católica. Então a gente não tem
muito essa, essa, essa ligação com a Igreja Católica. Se tivesse talvez o elo
poderia ser... podia formar um elo... uma corrente. Para desmistificar. Mas nem
quando seu Vitória era vivo, que participava ativamente da Igreja tinha esse
vínculo. Mas eu eu vejo que a banda é sim importante, “A essa banda é da minha
comunidade”. Fala assim, mas não tem aquela... aproximação. Falta
aproximação... entre a banda e a comunidade. Tanto que a gente convida a
comunidade, algumas pessoas para virem participar, nuca veem. Então tem essa
distância. Acham bonito a banda quando sai, falam que na comunidade tem mas num
se achega.
Elias: O Carnaval de Congo, você acha o
que do Carnaval de Congo?
Osnília: Hoje... hoje o Carnaval de
Congo como ele é feito hoje até... três anos atrás ele ficou muito... é...
comercial. Aquela questão... que alguns políticos que tiveram tinham
aquele intuito de chegar em Roda d´ Água, fazer aquela festança, sem
preocupação com a história do congo. Com a cultura do congo. aí enchia aquilo
lá de barraca, de música alta, Funk. Aí acabou ficando desacreditado o
Carnaval, por causa da violência em Roda d’Água, os moradores também acabaram
se distanciando um pouco, não querendo mais que ocorresse. As próprias pessoas,
“vou nada, carnaval só dá briga”, violência,
é destroem ônibus. Do ano retrasado pra cá, de dois mil e onze, dois mil
e doze melhorou porque ficou mais fechado, sem out-dors, fazendo aquela
propaganda toda, lembra? Isso assim, levou assim “A tem carnaval de congo em
Roda d’Água?” “ A num sei, tem, num sei,”. A mídia... A mídia ela saiu um pouco
de cena, digamos assim. Aí, isso chamou menos é... gente pra lá. Íam com outros
intuitos, pro carnaval de congo. Não iam lá pra ver a congada. Iam pra lá com
outros intuitos. Sem se preocupar com o carnaval de congo. mas ainda acredito
que é uma festa bacana, levada, tem que ser levada a sério, sem toda essa
mídia. Esse processo midiático que queriam colocar. A gente não tem espaço nem
estrutura pra montar um festa como era montada a cinco anos atrás. A gente não
tem. A gente não tem, em Venda Nova do Imigrante tem o Polentódromo. Aqui não
tem espaço para fazer o Congódromo. Seria interessante que tivesse, né? Mas a
gente não tem espaço pra tanto. E isso assim, quando... quando a gente começou
a ter o Carnaval de Congo ser conhecido em Roda d’Água, na década de... de
oitenta, prá cá, que a gente ia prá lá, não tinha banheiro pra gente fazer um
pipi, não tinha água pra você tomar, só tinha genipapina que os moradores de
Roda d’Água faziam e davam pra gente (bom era aquilo eim!!!). Nossa, como a gente
se divertia naqueles carnavais de congo. Porque não tinha essa questão toda da
mídia. A gente ia pra lá todo mundo e passava o di... a tarde toda em Roda
d’Água, se divertindo, acabava, seis horas da tarde e a gente continuava lá,
porque era bom.
Elias: E a questão da Santa? Como que
você vê a Nossa Senhora da Penha nesta festa?
Osnília: Eu vejo que é uma forma... É
por isso que eu falo, que os congueiros são católicos. Os congueiros
homenageiam seus santos, da Igreja Católica. São Benedito, Nossa Senhora da
Penha, São Sebastião. E aproveitam este dia pra tá homenageando Nossa Senhora
da Penha também, que é a padroeira do Estado. Por isso que tem, tem agora, tem
procissão, à Santa, depois tem a... o encerramento com os foguetes, eu vejo
interessante, porque mostra a devoção também dos congueiros. Já que não...
antigamente eles não podiam ir pra Festa da Penha, que era muito longe, não diz
a história que eles começaram a fazer o carnaval de congo por causa disso, em
homenagem faziam esse um dia festivo por causa de Nossa Senhora da Penha,
porque não podiam sair daqui?
Elias: O que você espera para o futuro
do congo?
Osnília: (Silêncio) Se a comunidade
aqui, os congueiros, o próprio bairro, não ficar atenta a gente vai acabar
perdendo essa banda de congo. Porque a maioria das pessoas antigas já se foram,
exemplo do Seu Antero, Seu Luis, Vitalino, Dona... Dano Lourdes, a mãe do Joel,
do Zé Luis Araújo, é... Seu Vitalino, Seu Vitório, Dona Lourdes, e outras que
já faleceram, que eu não lembro o nome agora. E os filhos desses congueiros
estão aí, mas muitos sentem vergonha de participar, essa é a verdade. Os
meninos que moram ali na rua do CMEI, o famoso morro do Grelo, mas não é Morro
do Grelo, é Rua Santa Lúcia, que fica já no Bairro Novo Horizonte, você que essa
questão de divisão, antes tudo era Piranema, e com a divisão dos bairros aí
ficou Santa... é Novo Horizonte pra lá. Eles tem vergonha, eles gostam de
acompanhar a gente, eles vão passear, porque vão andar de ônibus, de graça,
porque vão ganhar comida, mas entrar, eu já fiz o convite, vem pra vocês
participar, vocês são netos de congueiros, bisnetos, vem tocar com a gente. Mas
não tem esse interesse e a própria família que não chama pra participar. Eu
fico com muito receio de que com algum tempo, a gente não consiga levar isso
aqui a frente. Eu tenho muito receio. Eu gostaria muito de que os filhos dos
congueiros abraçasse a causa.
Elias: Você acha que o o Poder Público
tem algum papel nessa história?
Osnília: Deveria ter, né?
Elias: O que vc pode esperar do Poder
Público?
Osnília: O que se pode esperar, Elias? (pausa) O que se pode esperar do
Poder Público, Elias? (Risadas). Eu esperaria do Poder Público, que
as pessoas que realmente estão lá dentro se conscientizassem da tradição
folclórica do município de Cariacica, por que isso aqui faz parte do folclore
de Cariacica. Que deixassem de visualizar somente bens materiais, poder
aquisitivo, e lembrasse que isso aqui é um patrimônio da humanidade. É isso que
eu espero, que eles se conscientizassem. Das pessoas honestas lá dentro também,
que quisessem ver isso aqui a frente.
Elias: Eu tenho mais duas perguntas.
Uma é com relação ao Estatuto. O Estatuto, eu já cheguei a ler o Estatuto, e
tem uma parte ali que fala da... das obrigações do... das obrigações do...
Osnília: de cada membro da Diretoria.
Elias: É. Mas antes quando fala no
início, quando fala “aos membros da Associação é indispensável a cordialidade,
o companheirismo, a lealdade, a ética, a união, orientação recíproca com base
na solidariedade que os une fraternalmente”. Existe entre as pessoas que fazem
parte do Congo uma fraternidade, uma identidade que une?
Osnília: Sim. O Gosto. Gostar do Congo.
Isso pra mim, assim, existe essa fraternidade. Agora, é... Cordialidade não,
porque eles são meio aparentados então eles... (risos).
Elias: Eles são aparentados?
Osnília: Aparentados.
Elias: Então existe uma ligação
histórica, também.
Osnília: Existe uma liga... É lógico.
Por isso é que existe essa questão da fraternidade aqui, entre eles, eles são
solidários, eles brigam, eles se amam e se odeiam. O Benedito Pereá é pai do
Edmilson, o Benedito Pereá bate no Edmilson (risos). Se vê se não coloca isso
aí não (risos) . Mas existe, porque existem também respeito entre eles, eles
brigam, mas eles estão sempre juntos.
Elias: A Banda de Congo acaba unindo
também.
Osnília: Acaba unindo.
Elias: A Banda de Congo oferece alguma
coisa para os membros? Em termos de ajuda, em termos...
Osnília: Quando tem dinheiro ajuda,
porque quando seu Vitalino precisou de dinheiro, a Banda ajudou, na morte dele
a Banda tinha um dinheirinho também e pagou o ônibus para levar todos os
congueiros, os instrumentos.
Elias: Qual foi o valor?
Osnília: Foi o valor de Cento e cinco
reais o valor do ônibus.
Elias: E a banda...
Osnília: Ai todos foram caracterizados,
menos eu que estava trabalhando do CMEI, e de lá eu fui. A Banda tocou. Lá no
Cemitério de Novo Brasil. Foi muito... foi muito emocionante, o enterro de Seu
Vitalino. Foi enterrado com a roupa do congo. Foi porque a gente tocou. Foi um
enterro a altura dele. Altura no sentido de tá presente ali com a banda,
porque... que ele gosta de estar na banda. Era uma pessoa muito humilde, seu
Vitalino.
Elias: a última vez que eu vi o Seu
Vitalino tocar, foi lá no aniversário da Banda Mestre Itagiba. E ele estava
doente.
Osnília: Tava.
Elias: Ele tocou o tempo todo sentado.
Osnília: Se eu não me engano ele estava
com o câncer na Próstata.
Elias: Aí o Joel disse assim: “Não, a
família dele pediu para eu tomar conta dele, não deixar ele beber nada, mas ele
queria vir”. Aí ele tocou sentado o tempo todo, ficou o tempo todo. Então ele
realmente amava a banda. Em mais o que que a banda pode ajudar as pessoas?
(Silêncio) Remédio?
Osnília: Quando tem dinheiro ajuda com
remédio, é... (silêncio), paga passagem, se precisar... Na verdade a banda
nunca tem muito dinheiro também, né. Ce viu que nossa sede foi reformada, a
gente tá devendo aqui ainda. Mas tá bonita a Sede.
Elias: Mas está bonita a sede.
Osnília: Cada cachê que a gente ganha
agora a gente vai ter que um pouco da dívida. Falta banco pra sentar...
Elias: A última pergunta...
Osnília: Falta água, a luz aqui é
emprestada, a água é emprestada.
Elias: Mas isso mostra um pouco da
solidariedade aqui das (...).
Osnília: Isso mostra. Da vizinhança
também. A vizinhança cuida, a vizinhança aqui da... os vizinhos cuidam, ajudam
a olhar. Ajudam...
Elias: Então, para encerrar eu quero
perguntar uma pergunta bem subjetiva. Você pode falar o que você quiser. É bem
simples, o que é ser congueiro?
Osnília: É gostar principalmente do
congo. Das nossas raízes afro. É gostar do som do tambor. Do som da cuíca, da
casaca, das letras que são... Elas encantam, pela sua felicidade, pela dança em
si. Pela roupa, pela é... Eu gosto de estar no meio deles, pela simplicidade
deles, pela, pela... autenticidade que os congueiros tem. São muito autênticos.
Eles são, é... As vezes eu me sinto, eles me... eles me... eu vejo que eles tem
veem em mim uma âncora. Porque eu trato com carinho, com respeito, brinco com eles,
eles passam, toda hora que passam na porta do CMEI eu to lá, me comprimentam “o
dona Osnira”, eles nunca falam meu nome certo, eu cumprimento eles, eles vem e
falam as coisas deles pra mim. “Que dia que vc vai no ensaio da banda de
congo?” Eles gostam da minha presença. Então ser congueiro para mim é ter alma
de congueiro. É ter uma alma afrodescendente. É ter... é você gostar das suas
raízes. Saber que o Brasil é um país afro.
Elias: Osnília, canta uma música pra nós, pra encerrar. A que vc mais
gosta.
Osnília: Ah, eu gosto de todas.
Elias: Mas você tem uma preferida.
Osnília: Eu gosto, é... Eu tenho
várias, é porque eu não sei cantar direito. Eu gosto da “Iaiá você vai a
Penha”. Porque remete lá no tempo na escravidão. Eu gosto daquela também, “Eu mandei
carimbá, eu mandei carimbá o dinheiro, eu mandei carimbá”. Porque eu vejo
assim, a história do próprio negro, não tinha dinheiro. Acho que quando os
negros foram libertos, eu acho, é achismo meu, quando eles começaram a pegar em
dinheiro, eles começaram a trabalhar, eu penso que eles ficaram assim,
envaidecidos, “é meu. Aqui ninguém me toma, ninguém tira”. Então, é a forma de,
o carimbo é pra dizer que aquele dinheiro era deles, era... era o... dinheiro
que eles tinham ganho com o trabalho deles, não o trabalho escravo, mas o
trabalho que eles tinham prestado sem os açoites, do homem branco. Tem outras,
agora tem uma que eles... eu gosto dela mais eles é... eles pornogra... botaram
uma pornografia na letra, da pomba, minha rola pomba. Eles cantam assim:
“Pega na minha
rola” (risadas).
Osnília: Você procura saber dessa que
eu não lembro não. Vê com o Joel. Mas tem ou... Eu gosto de todas elas. Assim,
mais... Até Madalena que Benedito... Que Martinho da Vila veio que... deu
uma... parafraseada nela, que fez uma paródia dela, ficou conhecida no Brasil
inteiro. Até de “Madalena” eu gosto. Mas, a gente canta e tal, mas eu não vejo
aquela ali como raiz mesmo, entendeu? Eu vejo mais... virou senso comum,
aquela, aquela letra.
Elias: O Osnília, eu vou agradecer a você, pela contribuição. Esse trabalho
nosso é um trabalho que eu faço também pesando no futuro das bandas de congo.
Eu penso muito nisso, eu gosto das bandas, e tenho esperança de que as coisas
vão melhorar.
Osnília: Também.
Elias: Tenho esperança. Obrigado pela
contribuição.
Osnília: Só faltou Seu Benedito.
(risadas) Já vai dar oito horas e nada de Seu Benedito (risadas).
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